Sem título n°3

As novas cicatrizes apareceram sem que eu me desse conta de onde elas vieram. Eu me entrego ao ego e falho miseravelmente na rotineira tentativa de adaptação. Caixas empilhadas, atenção requisitada, falta de ar. Tanto ar e não me é suficiente, como se eu não coubesse nos espaços. Eu perdi o meu espaço. Perdi o meu reflexo quando me olho no espelho.

 

Eu estou lá fora, o que eu estou fazendo ali? Repetindo os mesmos erros dos meus pais, comendo uma maçã tão doce que eu não quero que acabe. Após me lambuzar e me sujar em algumas mordidas, não tenho mais nada. Um prazer instantâneo e as mãos sujas. Minha companheira me olha, me envolve, confusa, “tem alguma coisa errada”, mas se pra ela estou melhor, por que mudar? Nunca estive melhor.

 

A compulsão por limpeza, os móveis derretidos, os animais mortos no chão. Todo dia um passo à frente enquanto ouço a voz dizendo “volta”. Meus olhos na nuca me revelam, quando o som chega aos ouvidos, eles lacrimejam. Todos os meus brinquedos quebrados, as lentes dos meus olhos desfocados, o tédio do barulho dos outros.

 

Leio e releio o que foi escrito. Eu quero gritar e destruir tudo, mas o silêncio só permite abandonar o que comecei no meio, estruturas semi-prontas. Ferros retorcidos, galhos secos, o fogo que dançava comigo. Eu não queria que fosse assim, não queria. Nem esse texto era pra ser assim, mas só estou sendo honesto. Porque eu preciso.  

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